sábado, 28 de março de 2009

O Absurdo Banquete do Comedor de Amor

Diálogo 28 - Nas Entrelinhas dos Seres



- As entrelinhas que nos colocam passíveis de aprendizado, presentes no caminho entre a felicidade e o sofrimento, e até onde conseguimos nos adaptar nessa relação, sem nos cooptarmos ou nos suicidarmos.
- Aí é que me pergunto: cooptarmo-nos a quê? A quem? Suicidarmo-nos pra onde?

- Às vezes não atribuímos qualquer noção do quanto são úteis alguns infortúnios da nossa vida, na busca por respostas ao nosso ser-em-si.

- Certo que não há porque não se vangloriar do ócio, da vantagem de despender de uma vida proposta na inteiridade do conforto e da segurança. Mas é fato: qual caminho é mais interessante: o dos riscos, perigos e conflitos propostos ou a coerente e confortadamente satisfatória, num sentido amplo?

- Pode até parecer uma proposta de discussão neoliberalizante, de aceitamento das circunstâncias propostas pelo capitalismo, e blá, blá, blá. Mas em essência, seja no capitalismo, no comunismo ou em qualquer das terceiras ou diversas vias solucionais, essa discussão sempre será pertinente, afinal, qualquer desses caminhos será trilhado e construído por seres humanos, todos sempre passíveis de erros e enganos, relativizados.

- O fato é que os sabores das conquistas são muito diferentes quando a gente as alcança depois de passar por dificuldades extremas. O segredo todo está em não confundir intensidade (intensamente) com inteiridade (inteiramente).

- Não há possibilidade de sermos inteiros e/ou termos inteiro; nem os sujeitos, nem os objetos. Por isso também o ciúme se torna obstáculo inútil na nossa relação.

- Então, nessas relações ditas sociais existem espaços mútuos entre os seres. Espaços que chamo de alimite da liberdade. E eles devem ser observados, respeitados, a fim de se manter uma mínima organização possível do espaço-tempo entre os humanos.




- O exemplo de escalar durante horas a fio uma montanha tão mais íngreme do que se imaginava ser é uma parábola perfeita pra tal análise. Necessita-se de velocidade específica pra isso, velocidade tal que é a própria inclinação da montanha que impõe. Mas depois de toda a dificuldade, de se ater aos perigos propostos pela ação de subir, finalmente, quando se chega ao topo, percebemos quão melhor é o desfruto da vista do todo possível. Lá está o melhor ar, a melhor sensação.

- Ou seja, o encontro de soluções num engrandecimento psicológico, de organização interior do sujeito a partir do exterior (dos fatos-objetos).

- Que é o que muitos também chamam de “amadurecimento”.

- Nesse contexto, a experiência da vida talvez seja até mais importante do que a própria vida. Ou melhor, vida = experiência dela mesma. Óbvio. A busca pelas explicações sobre a existência (e a busca mais do que quer que seja), a partir do que se sentiu vivendo, em grande medida vale muito mais do que qualquer teoria (não negando, claro, a importância desta em determinados sentidos).

- Ser prudente é coerente, mas só quando necessário. Não é tão coerente quando à nossa frente não há mais soluções possíveis já especificadas para cada caso.

- Não há nada baseado no sofrimento e na dor que ofusque “um qualquer algo” que se finaliza glorioso quando, antes de qualquer coisa, ama-se do fundo da alma o que se fez ou faz, a fim de se encontrar presente em si e no próximo, na conseqüência dos atos.

- As dificuldades são cotidianamente normais. Elas só se tornam difíceis quando não percebemos (ou não queremos perceber, momento esse muito mais delicado) o ponto específico entre aquilo que somos ou fazemos versus aquilo que idealizamos ser ou fazer.

- O segredo está em perceber o contexto e, quando não, momentaneamente reagir positivamente ao sofrimento e jamais negá-lo. Como uma vez disse Nietzsche, esse seria o segredo dos felizes.

- É coerente, quando se analisa, por exemplo, as pessoas que vivem intensamente sua vida sem perpassar o alimite-da-liberdade, e continua no ciclo, em direção ainda não desbravada. Esse é o cerne do alto-controle. O fracasso faz com que haja transformação interior, na maioria das vezes ensinando maravilhas quando canalizado para si como experiência útil a fim de se desenvolver interiormente em vida.

- Afinal, nem sempre o que consideramos fracasso realmente o é.





- Observe um filho de dois anos de idade que não reconhece mais os pais como casal, na situação de os pais realmente não serem mais um casal no sentido ocidental tradicional judaico-cristão da coisa. Esse filho ama seus pais, quer-lhes bem, necessita deles por perto, mas não necessariamente como casal.

- Manter-se na ordem nessa situação, sentido-se triste por isso, é simplesmente não perceber uma ordem justificada por uma tradição organizada em apenas UM molde específico, dos MILHÕES POSSÍVEIS de serem construídos em sociedade.

- Quem foi que disse que, ao nascer, teríamos que passar uma imagem paralela à ordem costumeira, aos nossos herdeiros?

- As dificuldades causadas da diferença são de ordem meramente organizacional. E todo costume é passível de adaptação.

- As experiências dos que vivem passíveis de transformação (todos) buscando intensidade na vida (alguns) – e desfrutam das sensações maravilhosas que isso causa – são únicas. São explosões intermitentes, inexplicáveis. É das dificuldades que esse modo de vida se propõe que se abrem novas janelas a novos horizontes de possibilidades nunca antes imaginados.

- É como ter gradeada uma belíssima janela numa parede de cobogós. Os buracos da parede nos fazem ver o que está fora, porém numa certa segurança e limite. Quando a janela é aberta, temos uma vista à mostra para novos perigos e oportunidades, podendo-se ver outros ângulos antes nunca vistos, realidades nunca antes reparadas, respostas nunca antes alcançadas, que, com o tempo, tornam-se costumes a partir da adaptação.

- As dificuldades da adaptação é que pesam. Mas é esse peso que nos transforma e nos faz humanos em busca do que chamam vida, quando canalizado nesse sentido.



- E nesse sentido, a beleza e a força consequenciadas dessas propostas de risco compensam qualquer perigo.

- E como saber se não compensariam se não nos atrevermos a nos arriscar, se é isso que buscamos? Não falo somente da futilidade de se arriscar num grandioso investimento na bolsa de valores. Falo de se arriscar em função do outro, em busca de felicidade no caminho com o outro, a partir da compreensão e da paciência com as diferenças.

- As dificuldades geradas pelas situações de busca produzem energia suficiente para se renascer infinitas vezes, sempre mais forte e sábio do que antes, até o limite da morte (que nos transpassará para um desconhecido).

- O cerne da questão está em não amortizar o sofrimento; não paleativizar a proposta de busca da verdadeira felicidade na busca, no caminho “do-ser-feliz”. É como o próprio Nietzsche propõe, quando diz que aquilo que não nos mata, só nos fortalece.

- Nesse sentido, abolir o sofrimento é vagar no vazio porque o sofrimento transforma qualquer transição, e como tudo sempre é transição, dá a nós, humanos, atuação de uma vida menos irreal e mais pulsante.


- Vem!








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4 comentários:

. disse...
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. disse...

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Tudo bem, eu posto de novo.

= D

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A foto do cachorro racionalizado comendo ração é de Mark Zibert.

As demais fotos racionalizantes são de Bill Turpin.

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fel.

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Bruna Lenzo disse...

Então. Todos temos fraquezas. Todos temos necessidades. Todos precisamos dos outros. Todos dependemos dos sentimentos e das boas e más consequências que ele traz. Tudo isso é necessário na construção do caminho-vida. Beijo, amor.

b.l.

idem disse...

ERRATA: que eles (os sentimentos) trazem. =D